Há palavras...

...que chegam no momento certo para nos libertar.

Obrigado.

Viagem


 A banda sonora perfeita para partir.
A viagem da vida define-se por detalhes, palavras certas no momento errado, palavras erradas no momento certo, músicas que se tornam bandas sonoras, decisões certas e erradas ou mesmo confundir uma planta comestível com uma planta venenosa.
Alturas há em que temos de arriscar, partir para longe ou apenas dar um passo atrás, desaparecer na esperança de renascer, ir embora em busca de nos encontrarmos a nós próprios ou de simplesmente seguir a esperança de que o desconhecido seja diferente do conhecido.

De repente as luzes podem  apagar-se. De repente parte do que consideramos adquirido pode desaparecer. Mas será sempre uma viagem de descoberta, de encontros e desencontros e ganhando ou perdendo teremos sempre que a fazer.

De Rouille et d'Os

Um filme daqueles que eu gosto e que não era de todo aconselhável que visse agora mas o certo é que vi.
Como tantas coisas boas da vida surge por acaso, num encontro inesperado, numa descrição que nos prende ou num olhar que se cruza. Revela-se, profundo e cru, doloroso e dramático mas sempre deixando a tranquila sensação do desabafo.

Desperta a curiosidade teria de a satisfazer de alguma forma. Tratando-se de um filme que se encontra em exibição nas salas nacionais a forma mais simples de o descobrir seria mergulhando na penumbra de um cinema. Seria um bom filme para saborear numa sala vazia das matinés do antigo Quarteto, mas à falta de oportunidade, de companhia para partilhar a tela e até à falta do antigo Quarteto a opção pirataria não parece assim tão negativa. Feito o download no dia anterior com legendas em português e chovendo lá fora, instala-se o silêncio cá dentro, estou preparado para o que der e vier estando assim reunidas as condições para avançar. Vamos lá.

Sem preconceito por ser um filme francês enrolo-me na manta e assisto ao desenrolar de uma história onde a violência, o drama e o sexo se combinam com uma simplicidade deliciosa. O amor é condimento mas não é uma história de amor daquelas que estamos habituados a ver. Como na vida o amor é relegado para plano secundário na maior parte do tempo. E surge mais implícito do que explícito...

É bem verdade que esperava um abalo mais violento na minha (ins)estabilidade emocional, para os meus padrões acaba por não atingir o nível que a espaços promete. Eu teria levado o sofrimento a outros patamares, mas isso sou eu que acredito que, para o bem e para o mal, estamos tão mais vivos quanto mais intensamente sentirmos.


Silêncio e Abraço

No silêncio nem sempre se esconde a indiferença ou o desprezo.
Não poucas vezes é sinal de respeito e homenagem. Não interessa falar para dizer o mesmo que todos, não interessa falar se o nosso falar pouco ou nada alivia.
O silêncio hoje foi de respeito, foi de deixar espaço ao vazio que quem realmente importa nos deixa quando parte.

Um abraço amplificado pelo silêncio pode transmitir mais do que qualquer palavra ou outro gesto.
É esse abraço no silêncio que deixo a quem hoje homenageou quem partiu cedo demais.

Importante é...

Não desistir de nós próprios mesmo quando os outros desistem.

Guilty Pleasure ou orientação de vida?

Fechar capítulos, arrumar livros

Numa semana de fecho de vários capítulos e histórias dediquei-me igualmente a terminar a leitura que tinha pendente sobre a minha mesinha de cabeceira. O Prisioneiro do Céu, de Carlos Ruiz Záfon, é um romance que se entrelaça com anteriores romances de Záfon e nos faz puxar pela memória para recordar episódios do Jogo do Anjo e da Sombra do Vento.
Na mesma escrita simples e enredo misterioso consome-se rapidamente revelando muitos factos e pormenores que completam anteriores histórias. No entanto, ao fechar o livro percebemos que existem pontas soltas que podem servir de semente a novo romance. Ao contrário de outros capítulos, este promete novos desenvolvimentos.

Espero então por confirmação ou não desta minha suspeita. Não que goste de ficar na dúvida mas ao menos, a haver dúvidas, que sejam em eventuais sequelas de livros que nos capítulos que se terminam da vida real as coisas são bem mais claras.

Causa da crise

As grandes fortunas surgem e mantêm-se porque cada unidade de riqueza é tratada com a atenção devida, reduz-se o desperdício e aumentam-se os fluxos de crescimento, a necessidade de atenção constante é assumida como única forma de garantir o sucesso. Assim se explica porque o dinheiro chama o dinheiro, é apenas pelo facto de, efectivamente, quem tem riqueza cultivar o culto do material, da conservação e multiplicação dos valores materiais.

O problema surge quando se percebe que efectivamente a riqueza não traz felicidade. Quando se percebe que a acumulação de bens materiais num escasso número de pessoas e famílias atira uma enorme maioria de outros seres para limites de sobrevivência difíceis de suportar. Quando em nome do pseudo-sucesso pessoal e profissional se constroí um império de desgraça e infelicidade. Um castelo em cima de escombros, com vista para uma floresta queimada e com horizonte tapado pelas brumas da morte e do desespero não é um castelo. Mas na generalidade, as pessoas vivem com a ambição de possuir um castelo assim.

Difícil será que algum dia o geral das pessoas perceba que o importante não é conseguir riqueza e aumentar a colecção de bens materiais. Isso é só uma consequência, ou um acréscimo a tudo o que podemos ter se conseguirmos alimentar a verdadeira fortuna que temos ao nosso alcance - as pessoas.
Cuidar do próximo como sendo a maior riqueza que temos permite multiplicar a felicidade, alimentar o dinamismo da sociedade e, em último caso, fomentar a economia. O aumento da riqueza material poderá não ser exponêncial mas por certo será mais equilibrado e sustentado.
Se conseguimos perseguir objectivos tão concretos e vazios de sentido como comprar uma roupa nova ou um novo carro porque achamos tão difícil cuidar de um amigo ou mesmo de um desconhecido que num determinado momento precisa de ajuda?

O mesmo se passa com patrões, chefias, funcionários, governo, políticos, etc. Entende-se ou não que os patrões só serão patrões enquanto existirem clientes em condições de pagar os seus produtos? Entende-se ou não que os chefes só serão chefes enquanto tiverem funcionários para chefiar? Entende-se ou não que os funcionários apenas serão funcionários enquanto signifiquem uma mais valia para a estrutura?
Entende-se ou não que cada um de nós só será feliz se cultivar em seu redor essa mesma felicidade?

A vida de cada um de nós perdeu o sentido algures no momento em que a abstracção tomou conta das nossas opções. Em que fazemos o possível e o impossível para poupar um euro mas não somos incapazes de sorrir à vizinha da frente quando talvez isso bastasse para melhorar o seu dia.
Caminhamos para o fim, caminhamos para viver num formato de mega galinheiro de gaiolas, com espaços individuais, um propósito único, produzir mais riqueza, sem interacções com outros iguais e com a ilusão de vida que não será mais do que um processo para alimentar não sei bem quem, não sei bem o quê.

Nos dias de hoje a informação é imensa, chega-nos de todas as formas possíveis e imaginárias. Fast-Information, consumir e deitar fora, muita dela não chega sequer a ser assimilada. É preciso chocar cada vez mais para poder alcançar a mente de uns poucos, banalizam-se as imagens de choque, de países distantes que provocam revolta pelo mundo fora, com crianças feridas de morte, pais em desespero, jovens afogados em raiva. Mas quantos de nós olham para a realidade? Que fazemos para contribuir para um mundo melhor? Fazemos algo mais do que a simples partilha numa qualquer rede social da foto da criança morta ao colo do seu pai? E no instante seguinte? Publicamos um vídeo cheio de piada que relega para segundo plano a foto da criança e as lágrimas do pai...
Não se trata de não ganhar dinheiro, de não ter as nossas coisas. Não se trata de largar tudo e ser voluntário num qualquer campo de refugiados a batalhar contra as atrocidades que se cometem mundo fora. Não se trata de dar voz a todas as desgraças e notícias chocantes que nos chegam.
Tudo se podia resolver com simplesmente conseguir dar atenção ao que está ao nosso alcance. Ao nosso lado, entre os nossos amigos e conhecidos, entre os amigos e conhecidos dos nossos próprios amigos e conhecidos, a dois ou três passos de nós existem pessoas que precisam de nós. Esssas pessoas não partilham as suas tristezas. Não anunciam com fotos chocantes as suas desgraças. Também perdem filhos. Também perdem empregos, casas e bens. Também lhes bombardeiam a existência e destroem os seus sonhos.
Corremos o risco de começar a assistir ao desmoronar de famílias e pessoas. Se nada fizermos, um dia, talvez nos pesem na consciência as consequências daquilo que quisemos ignorar hoje. Estamos numa época violenta, em que pessoas sem escrúpulos se movem impunemente pelas esferas do poder e nos espoliam de bens, de vida e de sonhos. A única forma de sobreviver é estar atento, a nós e aos outros.

Qual foi a última vez que perguntei aquele amigo ou amiga que perdeu o emprego se está bem? Se precisa de alguma coisa? Qual foi a última vez que passei uma vista de olhos nas coisas que já não uso e as distribuí por familiares e amigos que delas precisam? Quando foi a última vez que fui tomar café ou almoçar com aquele amigo, amiga ou familiar que sei que não está a passar muito bem?
E qual foi a última vez que fui sair com amigos que estão bem e nos divertimos imenso? E durante esse tempo quantas vezes pensei nas tristezas, nas lágrimas de outros que naquele preciso momento também gostariam de ter condições de estar lá, a divertir-se sem ter que pensar nos imensos problemas que tem?

Não podemos viver constantemente à procura de tristezas. Não podemos resolver todos os males do mundo mas a causa desta crise é só uma. A nossa indiferença.