Última oportunidade

"Já pensaste que se procuro é porque ainda não encontrei?"

Disse deixando a pergunta a pairar no ambiente quente do quarto. Ao curto silêncio sucedeu a resposta em tom interrogativo.

"E o que procuras tu que ainda não tenhas aqui?"

Estremeceu por dentro, sem dar sinais de tal, fitou os seus olhos e acariciou-lhe o rosto afastando levemente o cabelo que lhe escorria pela face. As palavras tropeçaram no seu pensamento e o seu gesto característico do lábio denúnciou o receio que lhe bloqueara a resposta.

"Eu não sou o que queres pois não?"
"Ouve... não é isso..."

A tentativa de justificação foi interrompida.

"É isso sim... é bom teres-me a espaços, quando tens paciência ou quando te apetece uma queca fácil. Sabes que estou sempre aqui. Mas o que é que tu procuras mais?! O que é que podes ter que eu não te dou?! O que é que tu me dás?!"

O silêncio tornou-se incómodo, o ambiente quente e confortável do quarto começava a ser insuportável mas não tinha para onde fugir. Sentou-se na beira da cama, voltando-lhe as costas e suspirando procurou as palavras certas.

"Ouve... Vamos com calma..."
"Com calma já andamos nós há muito. Estou farta! Dizes que me queres, que sou isto e aquilo, que sou tudo e mais alguma coisa mas é só até te vires! Depois até nervoso ficas para me veres pelas costas."

Levantou-se e começou a recolher a roupa espalhada pelo quarto, provas do ímpeto e desejo que momentos antes se tinha apoderado dos dois.

"Onde vais... espera. Temos de falar!"
"Falar a merda. Estou farta! Não é chegar comer e deitar fora, para isso pagas e não tens que ter problemas. Espero mais! Mereço mais! Chega!"

Fechou-se na casa de banho do quarto enquanto ele procurava a sua roupa interior e um cigarro. Esperou na varanda que ela regressasse e refletiu nas suas palavras. Havia uma decisão a tomar e era a última oportunidade que tinha para o fazer.

"Adeus."
"Adeus?! Temos de falar... não vais sair assim sem mais..."
"Sem mais?! Falta alguma coisa?! Queres o quê?! Mais um bico?!"
"Eh pá... escusas de baixar o nível. Quero-te dizer..."
"Baixar o nível é o que tu me tens feito. Chega! Não quero saber mais nada! Adeus."

Saiu em passo acelerado sem lhe dar hipótese de resposta.
Colocando o cigarro entre os lábios, puxou mais uma dose de nicotina e encostou-se sobre as espreguiçadeira. Fixou os olhos no vazio do horizonte e ao ouvir o bater da porta disse em tom sereno:

"Eu amo-te! Quero-te sempre aqui... e tenho medo que um dia vás embora por ter perdido tanto tempo a perceber isto mesmo. Fica! Sempre!"


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